quarta-feira, dezembro 03, 2008

hum
fiquei com vontade
de novo
pensei que esqueceria
fazia tempo que pensava
não sentir falta
mas é mesmo
só chegar perto
ficar às voltas
o cheiro
a coisa que não se explica
vai entender...
eu não
só ficando longe
distraindo a vista
desviando o peito
porque vivo sim
sem esse negócio
quando quiser eu paro
já disse
já parei várias vezes
só preciso da distância segura
só preciso não ver
mais que vejo
pois que preciso
respirar mais solto
"deixa isso pra lá"
"vai e busca"
é a voz andrógina
ancorada no cerebelo
e eu prá lá e prá cá
eu o próprio vencido me convencendo do contrário
então vou e volto
parto e fico
espero e desisto
insisto e assisto ao recomeço
e ainda assim segue a cena
e mais um persongem me abriga

quarta-feira, setembro 24, 2008

segunda-feira, setembro 22, 2008

Ana Crônica

Meu tempo é tempo torto
de quem não sabe as horas
não usa relógio
de quem perde o trem
chega atrasado e pede desculpas pelo transtorno
de quem tá sempre atrás
de quem diz palavra em "momento impróprio"
de quem tenta o jogo depois dos 45 do segundo tempo
de quem ainda insiste em rimas pobres porque acredita que até isso pode ser charmoso
sou Ana Crônica
a que se perdeu no meio do caminho durante sua viagem interplanetária
descrobriu tarde demais "agora?" que o tempo não tem volta
e que as voltas que o tempo dá
são saltos mortais em seu pensamento
Ana Crônica está tonta com as voltas que o tempo dá
Ana Crônica tem náusea
e tenta o vômito
que é o retorno do que foi saboreado
mas o gosto é outro
"desculpe pelo transtorno"
" É Ana Crônica o tempo não espera você entender o tempo vigente"
Vai Ana Crônica ser retardatária na vida
"Perdeu, perdeu"
Perdeu a viagem
Ficou por aí tentando compreender "O Tempo das Coisas"
Sim há "um tempo das coisas"
o que é hoje já pode não ser amanhã
Mas Ana Crônica tem dificuldade em perceber
Está sempre atrás
Atrás das coisas do tempo que foge dela se rindo todo
Ana Crônica usa despertador, mas não acorda.
Perde o sono à madrugada e quer dormir pela manhã
Ana Crônica sempre atrás do bonde
sempre pela prorrogação do jogo
Ana Crônica
Perdeu o trem da história
Foi atroplelada
Atrapalhando o sábado

sexta-feira, setembro 12, 2008

quinta-feira, setembro 11, 2008

segunda-feira, setembro 08, 2008

quarta-feira, agosto 27, 2008

Godogo...

amo
amo tanto que.
amo tanto que por enquanto não digo.
amo errado.
sou errado.
todo errado
tudo errado
desabrigo
uma mão é uma mão
ou
uma mão é um mamão
eu lembro
sopa de ervilha nas ruas dessa cidade
lanche na Biblioteca Nacional
blusa de escola
e um godogo sorrindo
amo errado
sou este erro solto
perambulando na Cinelândia
sem encontrar
sentido

segunda-feira, agosto 25, 2008

Pra você Dô

Se fiquei esperando meu amor passar


"Se fiquei esperando meu amor passar
Já me basta que então, eu não sabia
Amar e me via perdido e vivendo em erro
...

Quando se aprende a amar
O mundo passa a ser seu

...

Cordeiro de Deus que tirai os pecados do mundo,
Tende piedade de nós.
Cordeiro de Deus que tirai os pecados do mundo,
Dai-nos a paz."

Legião Urbana


Ir contra a maré

Lutei toda a minha vida contra a tendência ao devaneio, sempre sem jamais deixar que ele me levasse às últimas águas. Mas o esforço de nadar contra a doce corrente tira parte de minha força vital. E, se lutando contra o devaneio, ganho no domínio da ação, perco interiormente uma coisa muito suave de se ser e que nada substitui. Mas um dia ainda hei de ir, sem me importar para onde o ir me levará.

Clarice Lispector - Aprendendo a viver

Aprender a viver

Pudesse eu um dia escrever uma espécie de tratado sobre a culpa.
Como descrevê-la, aquela que é irremissível, a que não se pode corrigir? Quando a sinto, ela é até fisicamente constrangedora: um punho fechando o peito, abaixo do pescoço: e aí está ela, a culpa . A culpa? O erro, o pecado. Então o mundo passa a não ter refúgio possível. Aonde se vá e carrega-se a cruz pesada, de que não se pode falar.
Se se falar - ela não será compreendida. Alguns dirão - "mas todo mundo..." como forma de consolo. Outros negarão simplesmente que houve culpa. E os que entenderem abaixarão a cabeça também culpada. Ah, quisera eu ser dos entram numa igreja aceitam a penitência e saem mais livres. Mas não sou dos que se libertam. A culpa em mim é algo tão vasto e tão enraizado que o melhor é ainda aprender a viver com ela, mesmo que tire o sabor do menor alimento tudo sabe mesmo de longe a cinzas.

Clarice Lispector - Aprendendo a viver



Thoreau era um filósofo americano que, entre coisas mais difíceis de se assimilar assim de repente, numa leitura de jornal, escreveu muitas coisas que talvez possam nos ajudar a viver de um modo mais inteligente, mais eficaz, mais bonito, menos angustiado.

... Há momentos na vida que o arrependimento de não ter tido ou não ter sido ou não ter resolvido ou não ter aceito, há momentos na vida que o arrependimento é profundo como uma dor profunda.

...Thoreau dizia... tenha pena de si mesmo. Ele aconselhava um pouco menos de dureza... Nesse caso devia-se abrandar o julgamento de si próprio... creio que podemos confiar em nós mesmos muito mais do que confiamos. A natureza adapta-se tão bem à nossa fraqueza quanto à nossa força. E repetia mil vezes aos que complicavam inutilmente as coisas - e quem não faz isso? - ele quase gritava com quem complicava as coisas: simplifique! simplifique!

Clarice Lispector - Aprendendo a viver

domingo, agosto 10, 2008



Os homens
Em água e vinho se definem os homens.
Homem água. È aquele fácil e comunicativo.
Corrente, abordável, servidor e humano.
Aberto a um pedido, a um favor,
ajuda em hora difícil de um amigo, mesmo estranho.
Dá o que tem
— boa vontade constante, mesmo dinheiro, se o tem.
Não espera restituição nem recompensa.
É como água corrente e ofertante,
encontradiça nos descampados de uma viagem.
Despoluída, límpida e mansa.
Serve a animais e vegetais.
Vai levada a engenhos domésticos em regueiras,
represas e açudes.
Aproveitada, não diminui seu valor, nem cobra preço.
Conspurcada seja, se alimpa pela graça de Deus
que assim a fez, servindo sempre
e à sua semelhança fez certos homens que
encontramos na vida
— os Bons da Terra — Mansos de Coração.
Água pura da humanidade.
Há também, lado-a-lado, o homem vinho.
Fechado nos seus valores inegáveis e nobreza
reconhecida.
Arrolhado seu espírito de conteúdo excelente em
todos os sentidos.
Resguardados seus méritos indiscutíveis.
Oferecido em pequenos cálices de cristal a amigos
e visitantes excelsos, privilegiados.
Não abordável, nem fácil sua confiança.
Correto. Lacrado.
Tem lugar marcado na sociedade humana.
Rigoroso.
Não se deixa conduzir - conduz.
Não improvisa - estuda, comprova.
Não aceita que o golpeiam,
defende-se antecipadamente.
Metódico, estudioso, ciente.
Há de permeio o homem vinagre,
uma réstia deles,
mas com esses não vamos perder espaço.
Há lugar na vida para todos.
Em qual dos grupos se julga situado você, leitor amigo?


Cora Coralina Do livro: "Vintém de Cobre", 4ª ed., Editora UFG, 1987, GO

sexta-feira, agosto 08, 2008

terça-feira, agosto 05, 2008

que vontade de te dar um abraço!

que vontade de te dar um abraço!
e dizer o não dito guardado por tanto tempo e que agora não é mais importante pra nossa história, mas (ainda)necessário pra mim. foi bom te ver a uma distância segura e... perversa porque impeditiva aos arroubos que a saudade poderia provocar.
vi com carinho um sorriso que conheci e que algumas vezes provoquei.
tive inveja. senti uma melancolia típica de quem sabe que o tempo não volta e que hoje consegue entender que nada poderia ter sido diferente para que hoje pudesse saber que nada poderia ter sido diferente. mas poderia. sempre pode. eu sei. mas essa sensação é uma dorzinha fina, leve, delicada que se aninha aqui no peito e que carrego ao lado das outras mais recentes que abriguei, só pelo hábito de colecionar desagradozinhos que alimentam as histórias que conto a mim mesma.
hoje te vi. e assisti a minha primeira aula de filosofia (é. pedi reingresso e voltei ao IFCS) e também foi minha primeira aula de música no Villa Lobos.
dia de retornos. e ó que é que eu busco? um pouco de mim. eu sei. e um pouco de você. desse "nós" que ficou lá. numa aquarela ocre. na memória. que gosto bom esse... de me rever dez anos atrás quando dividia meu tempo entre a sociologia e o teatro (e te perdia enquanto me descobria) e agora me fragmento entre as questões que me mostram quem sou. antes eu tinha certezas e objetivos. hoje tenho (algum) prazer e nenhum pragmatismo. cada vez menos. desculpe. sou isto. esse ser inconstante, insatisfeito.
que vai se rendendo a si mesmo por não saber bem de que outro jeito ser.
queria falar tanto mais. mas pra quê? pra me sentir melhor. de quê? pra saber que você sabe que sinto isto. por quê? as palavras são insuficientes. é como se elas saíssem de mim e quando chegassem aí já estivessem gastas, desbotadas, sem força. é a impotência da linguagem. engraçado. foi sobre isso que falamos hoje na aula de filosofia conteporânea. a distância entre linguagem e verdade. lembrei de pirandelo "assim é se lhe parece". também lembrei de platão: a realidade das coisas e a ilusão de sua representação, ou algo parecido...
e agora o dia acabou. dia bonito. solitário. desses dias que a gente passa sem falar mais que o necessário com os colegas de trabalho enquanto o fluxo do monólogo interno se mantém. ininterrupto. é por isso que tenho dificuldade de admitir que preciso de terapia. vou arrumando as gavetas quando falo. sozinha que seja. quando escrevo. mesmo um texto como esse... mas é que é muito bom me perceber por mim mesma. ver quem sou hoje pela opções que fiz há anos.é claro que hoje não seria tão dura, enfática, inclemente. não tenho mais energia pra isso. é. é a idade. mas é justo por ter sido que não sou mais (e que não preciso mais). não quero mais salvar o mundo. que peso tirei das costas! admito que não posso salvar nem os mais próximos. porque. quem disse que o que penso é salvação. que puta arrogância! se eu puder quero só viajar. fazer um mestrado pra "fazer jus ao percentual de aumento no salário" (e, claro, olha que luxo! ter o prazer do conhecimento...)
e deixar a vida seguir. com a saudade, sim tenho sim saudade, do tempo que via no teatro algo além de via de ascensão social. hoje nem isso. será que esse é o gosto dos trinta e poucos? não sei nunca vivi isso antes. como nunca tinha vivido as outras idades antes.
seja como for "ando devagar porque já tive pressa..."
e talvez. hum... talvez (pensei nisso) lá pelo terceiro período mude de curso: geografia, literatura, dança ou direito. não sei ainda.

sexta-feira, julho 25, 2008

segunda-feira, julho 21, 2008

terça-feira, julho 15, 2008

à toa

Eu quero é mais!
que seja
que venham todas essas dores que estão guardadas pra mim
eu sou assim mesmo. Me derramo, me espalho e me transbordo porque minha temperatura é essa mesmo. Eu quero é mais e sempre. Eu abro a boca na chuva. E como esse mundo e mastigo devagarinho pra não engasgar. Eu quero é gargalhar numa tarde de sol com um pouco menos de culpa.
Eu amo mesmo. E descubro camadas desse amor que há em mim. Quantas maneiras há de amar...
Eu quero todas! Eu preciso salivar, eu quero babar pela vida. Eu preciso correr pelas ruas fazendo de conta que tô numa dessas comédias românticas com final feliz.
Pra depois amarrar o cabelo, ir ao mercado e marcar um dentista.
Não nasci pra sofrer, já sei. Às vezes me engano. Às vezes. Mas é bom demais andar à toa.
Eu quero é mais! Andar à toa.

segunda-feira, julho 14, 2008

sei

passeio
passeio
pas seio
pas sei-o
passei-o
passei. o
paz sei. o
passei
passei
pas sei.
passei
passei
o
sei

terça-feira, julho 08, 2008

domingo, julho 06, 2008

muda (?!?)

não preciso dizer
nada
não posso
é só mais uma história sem importância nenhuma pra ninguém
talvez vire ficção. talvez um verso. nem isso. e pra que isso?
tudo isso. e nada. e só. depois nem história. pra quê?
porque preciso?
não sei. é só um mal-estar que vai passar. de novo. é só a garganta ardendo assim.
uma ponte direta entra o estômago e aqui, bem aqui esse ponto aqui na.
sabe aqui. onde começa a língua? então. é só isso. é só um mal-estar.
e tanto que foi dito. mais não. é um queimor assim. como quando a gente come pimenta.
então. não dá pra falar.
é só isso. sabe aqui no. um incêndio aqui no esterno.
é só. beber água. oito copos, né? bom pra pele. acho.
talvez ler. quem sabe? o que leu na última semana?
não tem importância nenhuma. porque somos os mesmos. não não somos mais os mesmos.
contar moedinhas pra ir ao cinema já não tem mais graça nenhuma.
(será que um dia achei graça nisso?)
mas não rimos mais um do outro ou com o outro.
as moedinhas hoje estão por aí no fundo de alguma gaveta.
mas agora isso não tem mais importância, ou como diria você relevâcia alguma.
talvez apenas uma tonsilite.
talvez só essa crônica (?!)muda.

quarta-feira, junho 04, 2008

segunda-feira, abril 21, 2008

Aí que.

Eita que não morri! Que tô aqui e nem sei porquê.
Eita que, agora que já sei que, quando o que se quer mesmo é sumir, evaporar-se, esfumaçar-se, sair-se de. Aí que. Mesmo quando, o que se quer é se esconder, pensar em não pensar. Esfarelar os sentidos. Refluir as idéias.
Se diluir, derreter, dissolver, desvanecer, dissipar, dispersar, desprender. Distrair-se de si.
Desviar-se do espelho, do relógio, do calendário, da balança, da conta, do medo.
Do olho alheio. Do soslaio.
Borrifar-se no tempo.
Aí é que se descobre que se resiste, persiste, permanece, mantém-se, conserva-se. Inteiro. (?)
Quer-se desistir-se. Deixar-se. Esvair-se. Esvaziar-se.
Quer-se ficar aqui, ali, assim, por aí.
Quieto. Minimo. Ínfimo. Invisível. Esquecido. Descansado.
E no entanto.
Ainda há.
Há. Ainda.
Por mais que se queira virar pó. Poeira.
Se existe.
Se há.
Se é.
Por mais que.
Findar-se. Sustar-se. Estacar. Estancar-se. Esquecer-se.
De si.
Aí é que.
Sustém-se. Assim. Gasto. Avariado. Abatido. Fracionado.
E (ainda) se quer. Um filete, uma sombra, um sopro, um espirro, sinal, traço ou vestígio. Um pretexto. Que seja.
Margem. Miragem. Que seja. Pra onde ir.

terça-feira, março 04, 2008

Memória Viva de Carlos Drummond de Andrade

Memória Viva de Carlos Drummond de Andrade

O Deus de cada homem

Quando digo “meu Deus”,
afirmo a propriedade.
Há mil deuses pessoais
em nichos da cidade.

Quando digo “meu Deus”,
crio cumplicidade.
Mais fraco, sou mais forte
do que a desirmandade.

Quando digo “meu Deus”,
grito minha orfandade.
O rei que me ofereço
rouba-me a liberdade.


Quando digo “meu Deus”,
choro minha ansiedade.
Não sei que fazer dele
na microeternidade

Carlos Drummond de Andrade.

quarta-feira, fevereiro 27, 2008

Só eco.

Estou voltando depois de quase um mês sem postar e cheguei a ter dúvidas se continuaria...
"Pra quê?"
É o que me pergunto. Sou só eco. É tanto barulho ultimamente.
Melhor calar. E não estou bem certa sobre o que fazer, aliás cada vez tenho menos certeza sobre quase tudo. Mas o que me animou foram os comentários desses amigos virtuais: Diego, André, e até o Iuri que veio ao Café pela primeira vez.
Foi bom lê-los.
Nos próximos posts vou contando alguns fragmentos desse meu fevereiro tão... Marcante.
Estou meio cansada, embora o sorriso esteja sempre às ordens pra ir levando a vida.
É meu escudo já aprendi faz tempo. As tarefas estão todas aí pra serem cumpridas.
As persigo. Agora vou dormir. Amanhã acordo cedo.

quinta-feira, janeiro 31, 2008

sábado, janeiro 26, 2008

Batismo de Sangue, livro que virou filme...

Lendo e vivendo...

"...Se um cidadão enfermo comparece a um posto de saúde, em princípio deveria merecer toda a atenção do Estado, independentemente do governo vigente. E todo governo, exceto nos regimes autocráticos e ditatoriais, é provisório, ao contrário do Estado, que possui caráter permanente. A promiscuidade entre governo e Estado em países de democracia instável e o modo como aquele abusa deste fazem com que o cidadão enfermo jamais tenha a segurança de que o serviço de saúde pública é um direito que não lhe faltará. Se o governo nomeia incompetentes para gerir o serviço público de saúde e atende aos lobbies da indústria farmacêutica e dos planos privados de saúde, interessados em minar serviços públicos que ameaçam a multiplicaçao dos lucros privados, então o enfermo terá abreviada a sua vida pelo simples fato de o Estado não ser uma instituição estável, consolidada, acima dos caprichos de cada governo que periodica e sucessivamente o ocupa."
Trecho de "A Mosca Azul - Reflexão sobre o poder" de Frei Betto.

sexta-feira, janeiro 18, 2008

Feito se soubesse

-oi. quê? fala! fala! queimada??? o quê? onde? Souza Aguiar?
Tá. tô indo.


- minha mãe... ela vai...

- vem cá.

- ela vai morrer! vai! tá toda queimada! de repente! que isso? que isso?

- cadê ela? a gente tem que saber.

- não sei, não sei. ela veio na ambulância com o enfermeiro, eu vim atrás.

- vamos perguntar. aí na portaria.

- alguém me ligando... é o enfermeiro. dei o número pra ele.

- quê ele disse?

- ele falou pra gente ir pra outra portaria. a "emergência grande".

- onde é isso? vou perguntar... é ali, lá, lá do outro lado, bora.

- não acredito! que tá acontecendo?

- oi. uma senhora queimada entrou agora aí. minha tia, quero saber onde ela tá. quero ver.

- ali! o enfermeiro que trouxe ela! cadê ela? o que vão fazer agora?

- boa noite senhoras. chegamos com ela agora há pouco, mas aqui não tem vaga. nós estamos entrando em contato com a central de emergência, pra saber onde tem.

- é o quê? quer dizer que minha mãe ainda não foi atendida? que ela ainda tá esperando o primeiro atendimento? ela foi queimada com soda cáustica! ela vai morrer! aquilo ainda tá queimando nela!!!

- olha aqui! isso tem que se resolver a gente não vai ficar esperando quando vai ter vaga sei lá onde. vamos ligar pra todo mundo! somos oito aqui, cada um vai ligando aí pra alguém, vê se a gente consegue vaga com algum amigo.
vou ligar pra minha amiga assessora de imprensa. tenho uns amigos médicos...
mas a gente pode levar ela pra um hostpital particular. pronto.
tá resolvido a gente vai levar pra um desses aí. particular.

- o que acontece senhora é o seguinte: ela chegou no posto de saúde 24 horas lá perto da casa dela, foi colocada no soro, mas lá não tem recurso pra casos de queimadura, então ela foi trazida pra cá, mas chegando aqui soubemos que não tem vaga e agora temos que esperar as ordens da central de emergência.

- esperar?! esperar o quê? a gente já disse que vai levar ela pra um particular.

- senhora ela está na nossa responsbilidade. não podemos liberar. ou ela espera aqui até a central nos comunicar uma vaga ou ela volta pro posto com a gente e lá se liberarem , vocês podem levar.

- como assim? o que você...

- são ordens senhora. a não ser que a senhora ligue pro particular e me ponha no celular com a pessoa responsável que garanta que lá tem vaga.

- não acredito.

- minha mãe vai morrer! o que é isso? o que é isso? ela vai morrer.

- calma! calma! tenho uns números aqui de uns hospitais, peraí. ó tá chamando, peraí.

- aquela merda daquela soda explodiu no rosto dela. ela engoliu aquilo. ela vai...

- cara, não acredito, eu falo do caso e tudo bem, tem vaga, quando me perguntam qual é o plano, que digo que ela não tem, aí dizem que pra esse caso o melhor lugar é o
hospital público... vou dizer que ela tem plano, quero ver.

- senhora, a senhora não pode mentir e dizer que ela tem plano de saúde. ela tem?

- se ela tivesse acha que ela tava aqui?

- então senhora, não podemos. se em vez de ir pro posto perto de casa, ela tivesse ido direto pro particular ou pro andaraí...

- cara, eu não acretido, eu não tô vivendo isso. Não tem vaga no público e você não deixa a gente simplesmente levar pro particular...

- são ordens senhora, não podemos, mas se eu fosse a a senhora voltava com ela pro posto, de repente lá eles liberam vocês. se vocês chegarem de táxi em qualquer hospital particular eles são obrigados a atender com plano de saúde ou não, se não é omissão de socorro. mas nós, ou esperamos aqui a vaga num hospital público, ou levamos pra um particular que gartanta que ela vai ser atendida, e claro que eles não querem atender sem plano alguém que já passou por um atendimento público...
ou voltamos com ela pro posto. Eu achava melhor voltar pro posto, aqui além de não ser atendida, ainda vai ficar aí exposta vendo gente entrando, sabe, vai ver muita coisa, gente baleada aí e tal...

- tão ligando? pra todos os amigos? todo mundo? não acredito nisso...

- minha mãe... o que a gente faz?

- bicho, vamos voltar e lá a gente tenta conversar com o médico, ele libera e a gente vai... vamos?

- ela tá esse tempo todo sem atendimento, só no soro...

- vamos, vai com ela na ambulância a galera aqui das tias vai de táxi. bora.

Sete horas da manhã do dia seguinte, mudança de plantão:

- acabei de falar com o médico, ele disse que ficaram a noite toda tentando vaga, mentira, claro, e que ainda não conseguiram e que quando conseguirem vão transferir ela, só que isso pode acotecer meio-dia, não tem previsão, e que se eu quiser levar que eu assuma a responsabilidade, vai ser à revelia, o que você acha?

- bora agora! vai lá. vou chamar um taxi. pro andaraí?

- liguei pra uma amiga psicóloga que tem uma amiga enfermeira no andaraí, ela falou que é só chegar lá que é atendido, hoje não é dia dela, mas que se a gente quiser ela vai pra lá.

- então já é.

Isto aconteceu na madrugada do dia 15 de janeiro de 2008. Fomos atendidas às 09 horas da manhã, onze horas depois do acidente, ocorrido na tentaiva de desentupir um vaso sanitário: depois de jogar a soda cáustica duas vezes no vaso seguida de água fervente, sem sucesso, minha tia resolveu misturar direto a química numa panela saída do fogo. Foi como um vulcão em seu rosto, pescoço e colo.
Na tarde do mesmo dia pesquisando na internet descobrimos que o "tratamento" de queimadura química é lavar, ensopar de soro, aplicar vaselina líquida, ou em pomada e proteger com gazes, e faixas pra não infeccionar, e claro beber muita água.
Era só isso que o pessoal do posto deveria ter feito se soubesse, e que agora até eu sei.
Por nossa conta decidimos que ela deveria tomar uma antitetânica.
E fazer um plano de saúde.

quinta-feira, janeiro 10, 2008

Estamos aí pro que der e vier. Ei, ei...

Felizanonovo!!!!
Eeeeee!!! Viva! Mais um ano! Mais Um.
Vamos ver o que nos traz este ano par. Meu pai diz que sempre teve sorte nos anos pares.
Bom começar o ano com essa convicção. Pelo menos nos anos pares...
Ano que vem a gente inventa outra história...
Hora de arrumar as gavetas, abrir as janelas, respirar fundo e se permitir fazer as mesmas promessas já sabidas não cumpridas.
E riscar da agenda aqueles números que já não se sabe nem porque anotou.
E olhar no espelho pra ver o que a lista cada vez menor de amigos provocou no semblante.
De admitir serenamente a dependência cada vez maior dos ritos de passagem para a sobrevivência em grupo: os presentes, ao almoços de confraternização, os amigos ocultos, os sorrisos congelados e a tentativa sincera de acreditar que isso vale alguma coisa. Que valha!
Mais eis que estamos aqui. Estamos aí pro que der e vier. Ei, ei...
Muitos projetos, sim como não, somos seres produtivos, pró-ativos e produtores.
Cada vez com vocabulário mais refinado (pelo menos. Será?) pra dizer o que já se disse.Cada vez glossário mais labintíntico para dizer (ou não)"te amo".
Não, não nada de acidez ( ou será azedume) logo no iníco do ano, não que isso!
Precisamos inventar um belo queijo pra correr atrás e acreditar que estamos quase alcançando.
Se não fosse o "quase".
Se não fosse o "quase" o que haveria?
Bom, isso é papo pra outro dia, se ainda tiver coragem de escrever alguma coisa.
De preferência que não faça Eduardo morrer de tédio.