terça-feira, agosto 21, 2007

segunda-feira, agosto 20, 2007

Sábado de sol

Sábado de sol. Muito sol. De um céu de Magritte tão absoluto que é impossível ficar em casa reclamando do inevitável passar dos anos. Foi o tempo que me trouxe aqui, que me fez ser o que sou hoje.
Portanto mesmo negociando com a preguiça, com a tendinite patelar (companheira de anos) e, claro, me convencendo de que a distância entre minha casa e a Cidade dos Esportes é pequeno detalhe, decidi assistir a alguma das finais do Parapan.
E estou aqui nesse lugar onde definitivamente medalha é mero objeto simbólico de vitórias diárias não contabilizadas. Conquistas pessoais, obstáculos vencidos, limites superados que fazem parte da história de vários dos aqui presentes, tanto atletas quanto platéia.
E eu aqui rindo à toa por testemunhar um clima raro de paz e liberdade entre os que circulam pelas arquibancadas, corredores e rampas. Todos querem comemorar a vida. Só. Só?
E estamos aqui no meio das matracas, cornetas e batuques que esquentam o coração do torcedor mais esforçado em ser discreto, como eu. Isso em plena decisão do basquete masculino entre Brasil e Argentina. Impossível ficar parado.
Então o gelo vai irremediavelmente derretendo e me vejo de repente no meio do estádio gritando: éeeeeeeeeeeeeeeehhhhhhhh Brasil! E levantando obedientemente ao comando do animador de platéia (profissão do futuro?) os braços na ohla.
E, claro, arrastando Djair que nesse instante só quer saber de detonar o sacão de pipocas que é (era) nosso. Ele embarca na brincadeira encantado com a multidão (quase) sincronizada.
De repente uma chuva de gaivotas de papel em todas as direções: as crianças do seu jeito participando da festa. O olho de Djair salta ao assistir o menino da cadeira de baixo lançar seu modelo fabricado ali na hora. Nem pisquei: lá se foi uma das páginas de um texto que eu estava decorando. Nas mãos desse cara que me surpreende sempre, essa gaivota ganha asas inimagináveis e rodopia livremente até cair na cabeça de uma menina que ri (como se tivesse sido sorteada) e o envia mais pra frente. Logo aparece muita matéria-prima (prospectos de divulgação) extremamente útil ao engenho de nossos Pequenos Príncipes de última hora. Uma menina de óculos pede ajuda para finalizar seu protótipo e assim ele possa voar mais longe, então acompanhamos, eu e ela, as mãos ágeis desse meu irmão que se me revela diariamente.
Inúteis os apelos dos organizadores e olhares recriminadores de alguns adultos.
Eu, em outra ocasião, provavelmente concordaria com as ordens de manter a ordem, mas diante daquele sorriso, minha rendição era certa, incondicional e voluntária.
E nós assim simplesmente experimentando. Nos permitindo. Sem preocupações, elocubrações, divagações, explicações, justificativas.
Nem quero saber se esse evento como qualquer outro vai ser usado na propaganda política da campanha eleitoral do ano que vem. Nem quero saber, porque já sei que vai, mas nesse momento sou apenas mais uma pessoa aqui igual a todo mundo.
Nesse momento com a alma mais leve num fim-de-tarde de inverno, quando Djair me mostra o pôr do sol, o que eu sei é que isso tem nome.
Isso é felicidade