sexta-feira, maio 04, 2007


Quem matou Juliana?

Quem matou Juliana?
Quem matou Juliana Pereira da Silva, de 23 anos? E Vladimir Novaes de Araújo, de 28 anos?
E Cláudio Matias da Silva, de 11 anos, e Alana Ezaquiel, de 12 anos,
e Clarisse Alves Mesquita, de 26 anos, e Franklin William Pereira da Silva, de 16 anos,
e Vanessa Calixto dos Santos, de 24 anos, e Eugracinha Rosa Martins, de 71 anos, e seu filho Antônio Martins, de 42 anos, e Acácio Valentim de Souza Menezes, de 2 anos e mais as dezenas de pessoas dissolvidas pelas bocas que escarram projéteis de AR-15, AH-K e outros modelos do arsenal produzido pelo incrível desenvolvimento tecnológico forjado pelo engenho humano.

Enquanto escrevo a Penha ferve em sua guerra civil particular.

Um estudo inédito conduzido pelo Instituto de Segurança Pública (ISP), da Secretaria de Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro, divulgado no fim de março, analisou registros de ocorrência de homicídio e lesão corporal feitos em todas as delegacias do estado no ano de 2006 e identificou 224 vítimas de balas perdidas, sendo 19 fatais e 205 não fatais. Os 19 mortos representam 0,4% dos homicídios por arma de fogo no estado.
No mês de janeiro de 2007, foram contabilizadas 31 vítimas – três fatais e 28 não fatais –, que representam uma média de uma vítima por dia.
Notícias de jornal ajudaram os pesquisadores a localizar os registros.

Quem matou Juliana?

O paulatino sucateamento que tem engolido a rede de saúde pública desse país?

Levada para o hospital Albert Schweitzer, em Realengo, Juliana ficou cinco horas esperando por uma cirurgia que não aconteceu. “Não tinha nenhum cirurgião vascular ou geral lá. Só deram bolsa de sangue. Ela ainda resistiu muito tempo. Ontem [26], a médica legista disse que ela não morreria se tivesse tido o atendimento certo”, afirmou Thiago Madeira, namorado da vítima. (http://g1.globo.com)

O Corpo de Bombeiros resgatou 2300 pessoas baleadas em 2006.
Quase metade dos feridos (1095) morreu antes de chegar ao hospital.
Nos três primeiros meses de 2007, o Hospital Getúlio Vargas, na Penha, recebeu 131 baleados. Desses, 50 morreram. (http://g1.globo.com)

Em outubro de 1998, Fernando Henrique Cardoso é reeleito para mais 4 anos de governo. Tendo em vista a crise econômica vivida pelo Brasil e por outros países “emergentes” o governo FHC aumenta ainda mais os juros para beneficiar os especuladores internacionais e propõe para o povo um ajuste fiscal prevendo a diminuição de verbas para o orçamento de 1999, inclusive na área de saúde. O corte previsto nesta área foi de cerca de R$ 260 milhões. A propósito desta redução o Ministro da Saúde, José Serra, divulgou um comunicado com o seguinte teor: “entre 1994 e 1998 o gasto com saúde, em relação ao PIB, caiu 12,4%. O total das outras despesas, no entanto, subiu 22,6%. Em valores constantes, as despesas da saúde aumentaram 17,9% enquanto as outras despesas do orçamento, em seu conjunto, cresceram 56,2%”.
A mesma nota do Ministério afirma sobre o CPMF que: “a arrecadação do CPMF cobrada a partir de 23 de janeiro de 1997 não beneficiou a Saúde.
O que houve foi desvio de outras fontes, ou seja, a receita do CPMF foi destinada à saúde mas foram diminuídas as destinações à saúde decorrentes de contribuições sobre os lucros e do COFINS”. (extraído da FOLHA DE SÃO PAULO, 6/11/98, p. 4)

HISTÓRIA DAS POLÍTICAS DE SAÚDE NO BRASIL
Uma pequena revisão
Marcus Vinícius Polignano
http://internatorural.medicina.ufmg.br/saude_no_brasil.rtf


Quem matou Juliana?

A crise de valores? O estilhaçamento da moral que alcança gente de vários calibres?
O vazio de ser dos meninos de nossas ruas?
O vácuo ético de desembargadores em seus gabinetes?

A falta de fé? Fé. Munição dos cristãos da Teologia da Libertação e dos comunistas ateus apaixonados, fervorosos pela causa da revolução do povo, que nos anos 70 preenchia buracos na alma de jovens crentes em seu poder de transformar o mundo?

A ausência de um desejo coletivo que promova o sentimento de pertencimento, de identidade, e de solidariedade de uma juventude que aprendeu desde cedo a apertar botões e comprar seus sonhos via internet em 10 vezes sem juros no cartão?

O esvaziamento deliberado e compulsório, por meio da mídia, da vontade de ser sujeito pela conveniência de ter (mais um) objeto?

“A minha gente hoje anda
Falando de lado e olhando pro chão.
Viu?”

“Os projéteis se fragmentam pelo corpo, a ‘dum-dum’ sai rasgando veia, carne, osso, tudo”.

Já somos a geração bala-perdida. A geração-farelo. Poeira de gente. Migalhas do ser.

Quem matou Juliana?

E a nós? Quem matou? A inércia, a pressa, o emprego, o desemprego, o cansaço, o consumo, a conveniência, a conivência, o abono? O abandono de nós mesmos?

Quem matou Juliana?

Nós? Com a letargia, o silêncio, o soslaio, a omissão, os queixumes, a ordem e os bons costumes, o condomínio, a rotina, a solidão, o isolamento?
O abandono de nós mesmos...